terça-feira, 25 de setembro de 2012

Ministério interdita propriedade agroecológica de Alta Floresta RO




“Produzir com base na agroecologia virou uma atividade criminosa”, denuncia Valdeci Ribeiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alta Floresta e integrante da direção estadual do MPA de Rondônia, ao questionar as perseguições que a agricultura camponesa vem sofrendo pelo MAPA (Ministério de Agricultura e Agropecuária) e as agências de defesa sanitária estaduais (IDARON em Rondônia).N a última sexta-feira (14/09), foi a vez da propriedade de Valdeci Ribeiro ser acionada. O camponês, que produz alimentos com base na transição à agroecologia, teve a sua propriedade interditada por técnicos do MAPA e da Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril do Estado de Rondônia (IDARON), e amostras de sal marinho, produzido artesanalmente por sua família para alimentar o gado, foram recolhidas para análise. As amostras seriam testadas e analisadas em laboratórios, para garantir a qualidade da carne do gado e do leite, e não “prejudicar a saúde dos consumidores”. Além do recolhimento das amostras, Valdeci ficou impedido de comercializar leite e a carne do gado. E ainda foi avisado: os animais poderão ser sacrificados, caso o resultado dos testes não cumpra com as normas da legislação sanitária.

A primeira ação semelhante, ocorrida em maio desse ano (29), apreendeu produtos do Mercado Popular de Alimentos do município de São Gabriel da Palha-ES e impediu que fossem comercializados pelos pequenos agricultores, com a alegação de não cumprirem com as exigências legais e causarem “riscos à saúde dos consumidores”. Logo depois várias intervenções da vigilância sanitária, Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (IDAF) e policia civil foram realizadas em pequenos comércios e açougues da região, gerando uma situação de vulnerabilidade e insegurança nos pequenos açougueiros e pequenos comerciantes.

Sal Marinho - uma produção camponesa
O sal mineral apreendido durante a ação do MAPA e IDARON, é resultado de cursos sobre agroecologia realizados em todo país e reconhecidos internacionalmente por várias organizações camponesas e estudiosos do tema. Valdeci participou da formação e passou a produzir o sal mineral e a utilizá-lo na alimentação do gado.





Para o camponês, o sal marinho, produzido de forma alternativa, não representa nenhum perigo à saúde humana, pois sua produção é feita a partir de estudos de resgate dos conhecimentos tradicionais, construídos historicamente pelas comunidades rurais. O resultado é um produto que garante qualidade à produção da carne bovina, pois supre as carências de alguns minerais e combate doenças causadas no gado, como carrapatos.

“Se a gente usasse hormônios e agrotóxicos no gado, nada disso estaria acontecendo. Mas essa é uma escolha política, uma postura ética do movimento, é o nosso compromisso com a produção de alimentos saudáveis, com o respeito ao meio ambiente e a cultura do nosso povo”, questionou o Valdeci.


Agronegócio X Agricultura Camponesa
Segundo Valdeci, o que está por trás do falso discurso jurídico e científico de garantir qualidade sanitárias aos alimentos, é a garantia do lucro exorbitante das grandes empresas transnacionais, que ganham milhões com o modelo químico de produção vigente. “Isso tudo se dá às custas da saúde da população. Ao mesmo tempo em que essas empresas produzem as doenças advindas desse modelo, também produzem o remédio. É um negócio muito lucrativo”, denunciou.

É o que acontece, de acordo com o camponês, com o modelo de agricultura desenvolvido pelo agronegócio. Ao se utilizar livremente de hormônios e pesticidas nos seus gados, agrotóxicos e outros produtos químicos nas suas plantações, o agronegócio cria um sistema “altamente perigoso à saúde humana, com a lei e o estado assegurando e financiando sua atividade”, questionou Valdeci.

“Reivindicamos uma legislação realmente comprometida com a saúde da população, que seja adaptada à realidade da pequena produção da agricultura camponesa e à produção agroecológica, para que possamos continuar produzindo alimentos saudáveis, com base em métodos naturais, sem uso de venenos e químicas, com respeito ao meio ambiente e à nossa cultura”, pontuou.

Resistência camponesa
Ao final da inspeção, os técnicos pediram para que Valdeci assinasse documentos autorizando a ação do MAPA. Numa ação de resistência, ele se negou. Na segunda-feira (17), os técnicos voltaram à propriedade na companhia de policiais militares para que o camponês se sentisse intimidado e assim aceitasse assinar os documentos. Valdeci se manteve contrário e não assinou.

“Continuaremos resistindo, em nome de cada camponês e camponesa que trabalha arduamente para manter viva a agroecologia e a agricultura camponesa. Nós, enquanto MPA, pedimos a solidariedade à toda classe trabalhadora, do campo e da cidade, para que possamos vencer essa batalha contra essa legislação à serviço dos interesses das transnacionais e insensível à nossa realidade”, conclamou.

Nota de repúdio do MPA
O Movimento dos Pequenos Agricultores vem a público manifestar seu repúdio às ações do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento - MAPA sobre a produção e comercialização de produtos agro ecológicos. Na semana passada o MAPA interditou a propriedade de Valdeci Ribeiro, em Alta Floresta –RO, por este estar utilizando sal mineral caseiro, alegando risco a saúde. No mês de maio, o ministério havia apreendido produtos oriundos da agricultura camponesa do mercado popular de alimentos em São Gabriel da Palha – ES, prejudicando a renda das famílias que comercializavam seus produtos no local.
O MPA já protocolou nota de repúdio exigindo o imediato desinterdito da propriedade em questão junto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, ao Ministério de Agricultura Pecuária e Abastecimento e hoje a tarde o documento será entregue ao Ministro da Secretaria Geral da República, Gilberto Carvalho.

"Não aceitamos o clima de medo que o MAPA tenta impor na região, a menos de um mês do lançamento da Política Nacional de Agroecologia e Orgânicos a atuação do MAPA é de punição a agroecologia, o que é causa de revolta entre o movimento camponês", questinou Valter Pomar, da coordenação nacional do MPA.

Abaixo segue o texto da nota de repúdio:
NOTA DE REPÚDIO À AÇÃO DO MAPA

Ministério da agricultura reprime agricultor ecologista
A menos de um mês do lançamento do Programa Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) pela presidenta da República, Dilma Roussef, realizado nos mesmos dias em que aconteceu o Encontro Unitário dos Povos do Campo, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) demonstra que continua refém das grandes indústrias agroquímicas ao realizar vários atos de repressão às produções agroecológicas do campesinato brasileiro, vide o ocorrido ao agricultor rondonense, membro da direção estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA-RO), pelo simples fato de que o mesmo utiliza técnicas e insumos agroecológicos em sua propriedade, no município de Alta Floresta do Oeste – RO.

Fiscais do MAPA e da Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril do Estado de Rondônia (IDARON) com forte aparato policial invadiram e interditaram a propriedade do agricultor no dia 14 de setembro, num claro ato ditatorial e repressivo, à serviço da indústria química preocupada com a diminuição na venda de agrotóxicos e outros insumos químicos naquela região, temendo que o exemplo da família de Valdeci fosse seguido por outros agricultores.

Este fato junto com a repressão ao Mercado Popular de Alimentos (ES) e milhares de outros casos que o Brasil conhece, mas que a imprensa não divulga, reforçam no MPA a convicção de que o MAPA continua sendo um antro cujos métodos são os mesmos do tempo da ditadura militar.

Acreditamos que sejam ações desaprovadas pelo ministro e pelo governo, mas recorrentes pelo interior do Brasil. O Ministério da Agricultura continua sendo um aparelho de repressão aos camponeses brasileiros e de proteção à indústria química, com um modelo de produção que esta envenenando os alimentos no Brasil e causando gravíssimos problemas de saúde à população.

O MPA exige que o decreto da PNAPO seja respeitado, que a interdição da propriedade seja imediatamente suspensa e que o governo promova uma ampla e geral reforma do Ministério da Agricultura para que fatos como esse não voltem a se repetir. O MPA informa ao governo que os camponeses não vão se intimidar e estão dispostos e mobilizados para responder à altura dos métodos repressivos utilizados pelo MAPA.

Brasília, 21 de setembro de 2012.
Direção Nacional Movimento dos Pequenos Agricultores

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